Curitiba vivenciará um colapso quatro vezes maior do que os experimentados até o momento, com média de 80 mortes diárias entre o fim de março e abril, caso não adote medidas mais rígidas, entre elas um lockdown de pelo menos 21 dias e a suspensão das aulas remotas e híbridas até que 70% da população do município seja vacinada. Essa é a conclusão de um estudo do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa), orgão do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovações, que analisou os impactos da pandemia da Covid-19 na capital paranaense.

A pesquisa, feita a pedido do Núcleo Sindical Curitiba Sul da APP-Sindicato, foi apresentada nesta quarta-feira (10) na Câmara de Vereadores pelo biólogo Lucas Ferrante, doutorando do Inpa. A convite da bancada do Partido dos Trabalhadores (PT), o cientista participou de forma remota da Tribuna Livre para falar do impacto do retorno às aulas presenciais no contexto da pandemia.

O biólogo destacou que Curitiba está com incidência da Variante P1 do coronavírus, uma nova mutação da Covid-19. São os municípios com incidência desta variante que hoje encontram-se a beira de colapsos do sistema de saúde. “A situação que se projeta para Curitiba por si só é grave, e o relaxamento do distanciamento social neste momento, além do retorno das aulas nas modalidades presencial ou híbrida deve agravar ainda mais a situação”, diz a nota técnica apresentada por Ferrante.

O estudo adota o modelo Susceptíveis-Expostos-Infectados-Recuperados (SEIR), que tem previsto com precisão o aumento de casos, internações, óbitos e a ocorrência de novas ondas no Brasil, a exemplo da segunda onda em Manaus. Tanto no caso de Manaus (algo concretizado) quanto em Curitiba, o pesquisador apontou que “a negligência em ignorar os resultados da pesquisa poderão ter um alto custo com perdas de vidas.”

O modelo SEIR projeta que Curitiba deve ter de 80 a 90 mortes diárias por Covid 19 no final de março e início de abril, podendo chegar a mais de 100 óbitos diários neste período. “A inviabilidade do retorno presencial ou híbrido para Curitiba neste momento é respaldada pelo modelo SEIR, onde estima-se que este retorno iria acelerar a transmissão da Covid 19, colocando em risco de infecção mais de 500 mil pessoas”, registra o documento apresentado. “Em Manaus os casos explodiram exatamente três semanas após a volta às aulas. Além disso, foi nessa explosão de casos que surgiu a nova variante P1”, alertou Ferrante.

Curitiba teve duas ondas de Covid 19 em 2020, com picos de mais de 20 óbitos diários. A primeira onda teve seu auge em agosto e a segunda, em dezembro. A partir do final de fevereiro de 2021 ocorreu um aumento explosivo no número de casos e o modelo estatístico computacional SEIR projetou a curva de óbitos para 80 diários no final de março/início de abril. O modelo SEIR prevê ainda que, com o agravante de não termos ainda um plano efetivo de vacinação, uma quarta onda de Covid-19 se forme a partir de julho.

Sobre a remotada das aulas presenciais, Lucas Ferrante destacou que essa decisão em Manaus foi o “gatilho” que desencadeou a segunda onda de Covid 19 na cidade, uma realidade inclusive reconhecida pela Fundação de Vigilância em Saúde do Estado de Amazonas. “A terrível experiência de Manaus deixa clara a inviabilidade de retorno presencial ou híbrida quando o município ainda está em estado de transmissão comunitária”, afirmou.

As aulas presenciais ou híbridas serão seguras, segundo a pesquisa científica, quando limiares de imunização de rebanho via vacinação forem adquiridos pela população, assegurando-se que a cidade em questão não esteja em níveis de transmissão comunitária. “Curitiba está em situação de transmissão comunitária, inclusive da Variante P1, que comprovadamente é mais transmissível e letal, inclusive em crianças, uma vez que 2% das mortes ocasionadas por essa variante são de crianças de até 5 anos”, afirmou o cientista.

Lockdown

Em relação ao fechamento do comércio, o biólogo afirmou que em nenhum momento as medidas adotadas por Curitiba e pelo estado do Paraná podem ter sido consideradas um lockdown. “A cidade de Curitiba nunca esteve em lockdown. Nós defendemos que a cidade necessitaria de um lockdown de 21 dias. Lembrando que lockdown também é defender a economia, pois onde se adota o lockdown o retorno é mais rápido e a economia volta a funcionar mais rápido”, defendeu Ferrante.

Tratamento precoce

Ao fim da Tribuna Livre, Lucas Ferrante respondeu questionamentos dos vereadores sobre o chamado “tratamento precoce”, um kit de medicamentos contraindicados pela Organização Mundial de Saúde (OMS) como eficazes na prevenção da Covid-19. Esse coquetel de remédios tem sido defendido por parlamentares de Curitiba, especialmente os da bancada evangélica.

O pesquisador refutou o uso de tais medicamentos como prevenção, afirmando que eles agem como placebo em pacientes que dizem ter sido beneficiados pelo uso do kit. “Esses medicamentos não funcionam. O que acontece é que foi criada uma máquina de Fake News quando ainda estava se verificando se esses medicamentos poderiam fazer algum efeito. Hoje está comprovado que não funcionam e, pior, podem agravar situações como são os casos de pacientes que usaram e tiveram que permanecer em média três dias a mais em UTI para se desintoxicarem”.

Para Ferrante, é irresponsabilidade médica a receita de tal kit como “tratamento preventivo”. “A água pode ter o mesmo efeito destes medicamentos no combate ao Covid. Infelizmente ainda existem médicos que não leem artigos científicos. É uma vergonha que ainda tenham profissionais defendendo esse tipo de medicamento para combate ao Covid. E os pacientes que receberam esse receituário estão sendo colocados em risco. Não existe tratamento miraculoso para Covid”, completou.

A nota na íntegra do Inpa pode ser conferida no link: https://bit.ly/3l13d1w

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