Prestes a firmar as primeiras Parcerias Público-Privadas (PPPs), o governo do Paraná abriu nova polêmica na semana passada ao encaminhar projeto de lei à Assembleia Legislativa para garantir que empresas que atuem em conjunto com o estado não saiam no prejuízo. A proposta cria uma conta-garantia abastecida com recursos públicos, que serão usados exclusivamente para que o governo cumpra com suas obrigações financeiras previstas em contrato. Especialistas, porém, divergem ao comentar o assunto.

Atualmente, o Executivo negocia com o setor privado a implantação de 17 PPPs por meio do programa Paraná Parcerias, criado no início de 2012. A primeira a sair do papel, em janeiro do ano que vem, deve ser a duplicação da PR-323 — entre Guaíra e Maringá. E, para garantir que o governo cumpra suas obrigações contratuais, será criada a conta-garantia, a ser gerida pela Agência de Fomento do Paraná. Pelo projeto, os recursos depositados nessa conta só poderão ser usados para assegurar o cumprimento contratual por parte do poder público. Os repasses se darão à medida que o estado firmar as parcerias.

Mecanismo é essencial para firmar parcerias, afirma secretaria

Por meio de nota, a Secretaria de Estado do Planejamento afirmou que só serão transferidos para a conta-garantia os recursos necessários para garantir que o estado cumpra suas obrigações previstas em contrato. Além disso, informou que cada contrato vai estabelecer o número de parcelas correspondentes às contrapartidas do governo e que, uma vez cumpridas todas as prestações, o dinheiro que estiver na conta será transferido para o caixa estadual. Disse ainda que o mecanismo é de vital importância para a viabilização das PPPs, de forma a dar maior segurança aos parceiros privados. Por fim, garantiu que áreas prioritárias não perderão recursos com a medida.

17 parcerias público-privadas vêm sendo negociadas pelo governo do Paraná com o setor privado. A negociação é feita por meio do programa Paraná Parcerias, criado no início de 2012.

Análise

Professor de Finanças Públicas da Universidade de Brasília, Roberto Piscitelli afirma que o setor privado sofre de uma deformação cultural característica do Brasil de ter uma excessiva dependência do poder público. Nesse cenário, ele avalia que as empresas cobram coragem e determinação do Estado para firmar contratos, mas, quando são chamadas a aportar recursos, entram com montantes menores que o esperado ou buscam financiamentos em bancos públicos. Um exemplo disso, diz o professor, é justamente o projeto do governo do Paraná.

“Exigir uma caução do governo? Do poder público, você espera que honre os compromissos com seriedade. Além disso, não é muito racional deixar dinheiro esterilizado [na conta-garantia]”, afirma. “As empresas parecem querer atuar sempre com o mínimo risco e o maior retorno. Se querem PPPs, que entrem para valer e assumam seu papel como nos outros países do mundo.”

Por outro lado, o advogado Bruno Ramos Pereira, coordenador do Observatório das Parcerias Público-Privadas, argumenta que a conta-garantia é comum na celebração de PPPs, sobretudo no Brasil, que tem uma tradição de mau pagador e sofre da descontinuidade de projetos nas transições de governo. “Esses recursos servem para um momento de desencontro, cinco ou seis meses, como forma de garantir que o pagamento continue até que o contrato volte a ser cumprido. Sem essa garantia, as empresas ou vão rejeitar o contrato ou vão pedir um retorno financeiro maior”, explica.

Pereira também rebate a análise de que a iniciativa privada, ao firmar acordos com o poder público, buscam aliar o menor risco com o maior retorno. “A alocação dos riscos varia de acordo com o projeto. São feitos estudos para determinar qual o melhor ator para assumir cada um dos riscos previstos. Se você alocar todos eles não mãos das concessionárias, obviamente elas vão pedir mais recursos públicos.”

PPPs devem ter bons contratos e fiscalização, dizem analistas

Em um ponto a respeito das PPPs, os dois especialistas ouvidos pela Gazeta do Povo, o professor de Finanças Públicas Roberto Piscitelli e o advogado Bruno Ramos Pereira, concordam: é preciso deixar de lado a ideologia ao debater o assunto. Segundo eles, não se pode ficar nos argumentos rasos de que só a iniciativa privada investe com qualidade, ou de que esse tipo de concessão não passa de “entreguismo”. O importante nessas parceiras, afirmam, é que os contratos sejam bem amarrados e que, sobretudo, que os serviços sejam fiscalizados.

“Uma PPP é como um martelo: com ele, você pode construir uma casa ou matar alguém. De qualquer modo, muitos recursos públicos já vêm sendo mal gastos por meio dos contratos tradicionais”, argumenta Bruno Ramos Pereira. Na visão dele, as PPPs são boas iniciativas quando o poder público não tem capacidade de investimento. “É preciso ficar claro que essa é de fato a melhor rota licitatória para prestar um serviço de qualidade ao cidadão, quando o Estado está sem recursos ou quando se demonstra que o serviço custará menos via PPP.”

Ele afirma ainda que são legítimas as preocupações, pois as parcerias envolvem contratos de longo prazo e por haver uma relação das empresas com o poder público antes da licitação. Por isso, defende que as discussões prévias passem por consultas públicas, que tudo seja divulgado e que se crie um site para centralizar as informações. “Prazos razoáveis no contrato, boa gestão e transparência radical são fatores fundamentais”, afirma.

Na mesma linha de raciocínio, Roberto Piscitelli defende que o Estado estabeleça em contrato regras rígidas de desempenho e acompanhamento dos serviços e que haja fiscalização. “O que não pode ocorrer é permitir que o serviço chegue ao horror e que o poder público deixe de se preocupar como se tivesse se livrado de uma responsabilidade. É preciso de um órgão que atue de forma permanente e eficiente cobrando as concessionárias.”

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