A Tribuna Livre de hoje na Câmara Municipal de Curitiba foi uma homenagem ao Grupo Esperança, que neste ano completa 20 anos de luta pelos direitos dos transexuais. Apesar da saída de alguns vereadores quando a Tribuna foi aberta, boa parte do plenário estava presente para a homenagem, promovida pelo mandato da vereadora Professora Josete.

Na apresentação do grupo, Josete destacou os obstáculos que os transexuais enfrentam. “Vivemos em uma sociedade desigual, mas ela é ainda mais desigual para quem é diferente, para quem não se encaixa nos padrões”, criticou. Josete leu ainda um poema (leia abaixo) da poetisa Letícia Lanz, participante do grupo e presente na homenagem. Em sua fala, a presidente do grupo, Liza Minelly, apresentou dados sobre a violência contra transexuais. “Há números mostrando que 70% das pessoas transexuais no Brasil já sofreram algum tipo de violência”, apontou.

Ela ainda descreveu qual era o sentimento por ter a oportunidade de falar na Câmara. “Agradeço à Professora Josete pela homenagem. Hoje eu sinto que faço parte desta casa”, afirmou. Liza ainda destacou a importância da organização para a conquista dos direitos. “Em 1994, eram apenas quatro grupos de apoio aos trans em todo o Brasil. Hoje são vários. Antes, nós apanhávamos da polícia e achávamos normal. Nos organizando percebemos que não, isso não é normal. Nós temos direitos”, lembrou.

O presidente da casa, Paulo Salamuni, enfatizou o compromisso da Câmara em receber todas as pessoas de maneira igualitária. “Recebemos vocês da mesma forma que recebemos governadores, prefeitos ou seja lá quem for. Vocês serão sempre bem-vindas nesta casa”, enfatizou o vereador.

Poema “Um dia celebrarão o dia da pessoa”, de Letícia Lanz

Nesse tempo que às vezes eu penso que nunca chegará,

ninguém mais vai se lembrar do dia

em que houve essa divisão absurda entre homem e mulher,

índio, preto, branco e pardo

homo, bi, hétero e coisa nenhuma,

como se para o Universo fizesse diferença

as pseudo-diferenças que inventamos

apenas para justificar os nossos dogmas sagrados

 

Nesse dia, posto que não haverá mais categorias,

hão de comemorar apenas o dom de ser gente,

sem nenhuma releitura política ou mercadológica da ocasião

sem nenhuma alusão exclusiva a virtudes

ou defeitos dessa ou daquela categoria

sem necessidade de denunciar a falta de respeito por esse ou aquele

posto que todos, indistintamente, serão naturalmente bem vindos

sem que ninguém lhes peça carteirinha à porta do evento

para saber se são, mesmo, gente.

 

Nesse tempo,

impossível e utópico para a mesquinhez dos nossos hojes,

ninguém mais será ninguém, sob nenhum pretexto.

Ninguém mais ficará de fora,

chupando o dedo e remoendo de inveja,

arquitetando planos sutis e nefastos

de como tomar a festa de assalto

ou como imitar os atributos dos convidados pra poder ser recebido.

 

Ah, tempo bendito que não chega!

Os corações estão minados de medo e mágoa

e as mentes por demais instruídas em conceitos e padrões!

 

Mas se um dia vieres,

se um dia venceres a incredulidade de uns e a ingenuidade de outros,

faça de conta que nós

– classificados, divididos e rotulados desse tempo de antes –

jamais existimos em tempo algum nesse mundo!

 

Quando esse tempo chegar, revoguem o passado

e celebrem apenas o presente do ser gente,

e a diversidade de se ser gente

enfim incorporada e compreendida

como a mais pura e essencial manifestação

da própria vida.

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