(Matéria por Fernanda Foggiato | Revisão: Alex Gruba — publicado originalmente 18/04/2024 20h10 no site da Câmara Municipal de Curitiba)

A Câmara Municipal de Curitiba (CMC) recebeu, na noite desta quarta-feira (17), seminário com o tema “Mobilidade Urbana: Histórico e Desafios”. Proposto pelos vereadores da Federação Brasil da Esperança (PT, PV e PCdoB), o debate reuniu painéis com especialistas em políticas públicas na área. O destaque, na discussão, foi a nova concorrência do sistema de transporte público da cidade, licitação que deve ser feita em 2025.

Fotos: Carlos Costa/CMC

“Espero que a gente continue este debate, porque é a partir das discussões que a gente pode avançar e nos organizar, enquanto sociedade, para cobrar do poder público”, concluiu Professora Josete (PT). Favorável à tarifa zero, Giorgia Prates – Mandata Preta (PT) lembrou dos trabalhos da Comissão Especial do Transporte, em 2023.

A vereadora também frisou a proposta para que a Câmara Municipal crie uma frente parlamentar para acompanhar e fiscalizar a nova concessão do sistema. A votação do requerimento foi adiada e ficou para a próxima semana (422.00002.2024).

A engenheira civil Tainá Andreoli Bittencourt, que é doutora em Engenharia de Transporte, apresentou o primeiro painel, em que a mobilidade foi apresentada sob a perspectiva do transporte público. Ela ponderou que 46% do modal de Curitiba está focado nos automóveis e apenas 20% dos deslocamentos são feitos por meio do transporte público, conforme pesquisa de 2017.

“E a gente vê que Curitiba tem a tarifa mais cara dentro das capitais”, prosseguiu. Tainá chamou a atenção para a faixa de renda familiar comprometida com a passagem de ônibus e disse que os marcadores são ainda mais desiguais dentro dos recortes de gênero e de raça. “O que indica um não acesso à cidade, né?”, refletiu.

“A grande questão que a gente precisa discutir não é esse valor de subsídio [à tarifa], mas de onde veio isso, o que me preocupa aqui é muito mais o como o que a gente tá fazendo essa remuneração das empresas, é a forma de transparência”, argumentou. A remuneração por passageiro transportado, avaliou a palestrante, “leva à precarização do serviço, […] como a gente viu na pandemia”.

A curto prazo, defendeu, o debate deve ser focado na próxima concessão do transporte coletivo. “O que a gente tem, de fato, de oportunidade no próximo ano é o vencimento da licitação do transporte público atual”, afirmou Tainá. Em sua avaliação, é necessário “melhorar a qualidade dos ônibus e reduzir a idade da frota”, barateando e atraindo mais pessoas para o transporte coletivo.

Mobilidade e planejamento urbano: sistemas de transporte integrados

Doutora em Políticas Públicas, a advogada Mariana Auler foi a responsável pelo segundo painel. Ela focou sua discussão a partir do ponto de vista do planejamento urbano. “A gente parece que está estagnado”, opinou sobre o atual sistema viário de Curitiba. “A gente ainda está muito estruturado em cima do projeto de 1965 [com o Plano Preliminar de Urbanismo, antecessor do Plano Diretor de 1966, […] mas, de algum modo, perdura até hoje esse status de modelo”, disse. 

Mariana defendeu que existe uma estratégia política de sustentabilidade retórica, desde a década de 1990, em que a administração pública municipal usa “pequenos exemplos que são muitos noticiados na cidade, mas a gente tem uma carência muito grande de soluções estruturais”. Ela citou que a região sul de Curitiba é a mais adensada, mas, ao mesmo tempo, possui gargalos em seus sistemas viários e no transporte público. “A gente precisa pensar em sustentabilidade, a gente precisa pensar em descarbonificação”, continuou. No entanto, para a advogada, o mais importante não seriam os ônibus elétricos, e, sim, desincentivar o uso de veículos individuais.

“A gente vai ter a renovação da concessão do transporte público em Curitiba, mas a gente também está em um processo de revisão do plano de desenvolvimento urbano da Região Metropolitana de Curitiba, revendo a concessão do transporte público da Região Metropolitana de Curitiba, […] e a gente tinha que pensar isto de uma forma integrada, e eles estão de uma forma extremamente fragmentada”, discorreu.

Em termos do planejamento,. A gente está contratando uma modelagem para a concessão de transporte público de Curitiba em que se desenham cenários para a região metropolitana e a integração metropolitana, enquanto o estado também tá fazendo também”, complementou a segunda palestrante do seminário. “E a gente vai fazer o Plano Diretor, ano que vem, aqui em Curitiba.”

Para a advogada, um planejamento eficiente “diz respeito a recurso público também”. Ela chamou a atenção para a importância da pesquisa de origem e destino dos usuários, estudo usado para identificar “onde tem as maiores demandas, para onde elas [as pessoas] estão se deslocando”.

Na cidade carrocêntrica, desafios às bicicletas e nas calçadas

terceiro painel da noite foi apresentado pela designer Yasmim Reck, mestre em Planejamento Urbano, integrante do Instituto Democracia Popular e da Articulação Mobilidade Popular. Ela abordou conceitos do marketing e da publicidade para explicar como surgiu “a cidade carrocêntrica”. “É a indústria do automóvel há mais de 70 anos vendendo elegância, […] esse apelo do automóvel”, pontuou.

“Essa construção da cidade carrocêntrica”, prosseguiu Yasmin, começou com a “produção em massa de consumidores, a produção em massa de motoristas”, dissociando a ideia do automóvel como um artigo de luxo. O tom de Henry Ford, disse a pesquisadora, “foi tentando regrar a vida dos trabalhadores da fábrica dele pra que eles, trabalhadores, pudessem comprar um carro”.

A frota de carros em Curitiba, entre 2007 e 2022, “quase que dobrou”, chegando à taxa de ocupação de 1.8 habitante por carro. “Essa prioridade do automóvel tem trazido problemas sérios pra nossa sociedade, é uma epidemia no Brasil, com 5 mil mortos todos os anos”, afirmou sobre os acidentes de trânsito. Outro impacto do aumento da frota, reforçou Yasmin, é a poluição.

“Eu acho que é fundamental olhar pro meio ambiente”, opinou. A palestrante levantou mais dois desafios: o incentivo às bicicletas, pela demanda de mais ciclovias em Curitiba, e as melhorias nas calçadas da cidade. “No caso da calçada, eles querem responsabilizar os imóveis e não está dando certo? Então a gente tem que inverter essa prioridade”, refletiu Yasmin.

Assista ao debate na íntegra:

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